sábado, 12 de março de 2022

Inesgotável

Daniel Braz

Eis a frase do dia:

Louvada seja a mudança suficiente pra encher a pança de uma família.
Pois, se o estômago pesa mas se move o bastante depressa,
A fome até vira,
Tira o sinal de alerta.
Até porque fome de adicto é abstinência
-- disso, afinal, já estou convicto.

Em minha invenção, sobretudo,
Me fio.
Como em "Vinte mil léguas",
Eu sigo.
Nem mesmo luto.
Sou livre de coerção,
Já posso ouvir um assobio,
Ou algum grito de "pega ladrão!",
Ou qualquer coisa do tipo.
Nesse caso, nem ligo.

Ó, Verdade,
Que tipo de coragem requer seu domínio?
Besta selvagem, essa sim,
Ser arisco,
Felino...
Não se deixa domar.
Até que abre concessão.
Possui a si mesma, inteira,
Mas cada um tem dela só um fio.
Pois ela é o quente e o frio,
O todo e o vazio,
A águia e a lesma.
É natureza, é tudo possível,
Ela diz tudo em um só livro,
Em uma resma,
Em uma página.

Só sei que algo sei,
É o que digo
Com toda certeza,
A mesma de Sócrates.
Pois era esse o sentido.
Sobre o "nada", afirmo:
Limite.
Sempre relativo.
E, tendo dito isso,
Apenas o todo me escapa,
Essa fonte inesgotável.

E assim eu indico
O motivo definitivo
Pelo qual valerá sempre
Estar vivo.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Sede de sangue

Daniel Braz

Sede de sangue,
Ânsia de morte.
Se o alvo é certeiro,
O impacto é atômico.
Com sangue nos olhos,
Lanço sua sorte.
Fome de homem,
Efeito quântico.

Inação é ação
E ilação tem suporte,
Solo-sintoma.
Fantasia astronômica
No limite do empírico.
Miro-te no espaço,
Te sigo.
Feito vampiro,
Te sugo,
Talvez te mato.

Ai de mim, o pecado.
Deveras explícito
Deveras errado.
Demasiado.

Ai de mim.
Externamente gelado?
– é possível, provável.
Porém, incendiário.
Eternamente.
Arsenal de insultos,
Inventário sádico.
Surtos involuntários.

De onde o horror?
O massacre?
O disparate?
Evitando o combate,
O eu implode,
Até que explode,
Esvazia-se de ódio.

Homem-besta,
Homem mórbido.
Detesta o mundo
Ou a si próprio?

quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

Prezados clientes

Daniel Braz

Prezados clientes mundanos,
Em nome de quem lhes serve,
Lamentamos o incômodo,
O desencontro pandêmico,
O coração que ferve,
Certo lapso mnemônico.
Pedimos paciência...
Cedo ou tarde, será mais fácil.

Enquanto isso, aguarde,
Por gentileza.
Mantenham a potência sem ato.
No momento estamos sem serviço,
Mas atendemos por correspondência.
A vida recomeçará em instantes.

Em alguns instantes...
Prezados clientes...
Amantes...
A vida...
(🎶)
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sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

Tudo ou nada

Daniel Braz

Confio, sim, em você,
De quem pouco mas muito sei.
Me entreguei, assim mesmo, sem saber.
Pois já sei o bastante sobre mim.
Deixo logo as cartas na mesa,
Vejo um padrão previsível.
Me antecipo.

De você, conheço apenas sua beleza e esse seu lindo jeito
Perfeito... Magnético... Provocante...
O resto pressinto.
Adiante, desilusão inevitável...
Ora, claro, isso também me diz respeito.
Não é algo hipotético, é certeza.
Mas ela se sentiu apaixonada, ou foi cena?
Safadeza? (Risos)
Eis a questão. É o que me pergunto...
Pois de minha parte, eu não minto.

Paciência comigo...
É que cheguei no "tudo ou nada"!
Sim... De antenas ligadas, mas...
Uma aposta com o Diabo já foi feita.
Com ele não há ressarcimento,
Não tem assunto.
Apostei com base em visão privilegiada,
Mas ela pode conter impressão errada.
Ou pode até ser uma cilada (?).

Desfruto, descompensado, este momento
De ter fé na lembrança do que foi,
Sem pensar em receita.
Momento de largar-se em Īśvara,
De lutar com Kṛṣṇa,
Encarar o dever sem bambear.
Não deixar que o medo me paralise
Na obediência à ordem de Durgā.
Sim, pois obedeço, não a mim,
Mas à razão revelada vinda do Alto.
É um caminho em que o amor é o oráculo,
E a bússola, e o antídoto.
Onde brota eu vou num salto.
(Ou, como nesse minuto, nadando a braçada)
É... Com coração não se brinca.
Eu quero é tudo... ou nada!


quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Vou à Bahia

Daniel Braz

Vou à Bahia, pra onde me atrai a vida,
Lá, onde quero estar.
De coração pulsante,
Como eterno amante,
Cujo amor se aprimora.
Me liberto da gaiola dos puruṣārthas,
Em que mora a sociedade dos seres normais,
Preocupados com suas posses e ambições banais.
Não sabem ouvir a voz da vida...

A minha me manda ir pra Bahia,
Não porque aqui seja tão pior que lá,
Mas é errado eu estar, agora, em outro lugar.
Enfim, sou implacável:
Não tolero contradição.
Familiarizado demais com a solidão,
Vivo o que acredito,
Contra a ausência de sentido.

Não adianta apelarem pra segurança,
Sem nunca terem se despido,
Em seu latente sofrimento,
Que, contudo, tem fim,
Junto a ignorância,
E para a mudança nos chama.
Ó, ardente combustão!
Inflama e conduz,
Das trevas à luz!

Quero, pois, estar com ela,
Bancar meu desejo,
Sair dessa cela.
Aqui, estou em repouso,
Atrás das grades.
Me sinto passivo,
Busco atividade.

E, ainda mais,
No pleno gozo das faculdades,
Conheço algo que não se ignora,
Pois registrei na memória,
E sei:
É coisa de apreço,
Que não se joga fora.

Ah... O que há na Bahia me enamora...

Os que me advertem
Não se divertem,
Mas reconheço seu ponto valioso.
Porém, evito olhares sérios.
Sou criança arteira,
Menino treloso.
A vida é brincadeira,
Eu encontrei a minha parceira:
Com quem tudo é mais gostoso!

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

De um só golpe!

Daniel Braz

Sinto impactante presença!
Satisfação estética,
Prazer e conforto,
Paz,
Reação química,
Desejo de propósito,
Opinião veraz,
Querer bem.
Não se trata de mera crença,
É impressionante...
Não importa como éramos antes!

(Sinto sua boca em minha orelha.
Ouço a sua voz umedecida.
Os meus olhos estão vendados
E minha alma entumecida.)

Não lhe conheço,
Lhe apreendo.
Vou além do concreto.
De que valem mil conceitos
E toda epistemologia
Frente ao mais nítido sentimento,
Claro como a luz do dia?
Afinal, é próprio da natureza,
De um só golpe, a quem contempla,
revelar a Ideia,
Em toda sua certeza,
Na eternidade do momento,
Na suspensão do espaço tempo,
Na essência por trás do aparecimento.

Fundamento da alcateia humana,
"Telos" de todas as regras.
Com você não canso de conversa.
Confio em sua presença,
E conhecê-la muito me interessa.
Sim, na vida não tenho pressa,
E nem sei aonde quero chegar.
No amor, por certo...
Cheguei!

terça-feira, 3 de novembro de 2020

Ensejo

(01/11/2020)

Daniel Braz

Como posso estar errado
Se nada nunca foi tão claro?
A vida não dá garantias,
Apenas ensejo,
E a felicidade não espera,
Não dá tempo ao desejo.
É pegar ou largar.

Alguns pensam que felicidade é produto em oferta,
Procuram-na em vulgares prateleiras.
Até parece...
Ela não se prestaria a tamanha pobreza...
É nas horas certas, e em determinados lugares, que ela se faz presente,
E logo depois perece:
Fenômeno único em espécie na natureza...
Pouco recorrente, sim...
Mesmo ao longo de vidas inteiras!

Aos indecisos, meus pêsames!
A auspiciosa felicidade sabe do seu valor.
Ama quem não mede consequências
Quando contempla sua essência,
Quem age por amor.
(O terror dos utilitaristas)
(Sobre você e eu ela traz notícias).
Sabe que nos têm em suas mãos,
Ainda que alguns pensem o inverso.
Por isso mesmo, esnoba:
Não foi feita para quem vive disperso.